Prelúdio
Educado em berço de ouro, rodeado por uma rica cultura e bons hábitos familiares crescera Argus Vittorio Capellaro,e como o destino já o reservava não o fez diferente, despertara verdadeira paixão pela arte e em particular pelas peculiaridades da época do Renascimento.
Viveu o período da sua infância como qualquer outra criança italiana vivera, onde passava horas na janela vendo o movimento da rua, maravilhado com a vivacidade e loquacidade dos romanos ou ainda entretendo-se com os afazeres do pai. Via Del Corso, localizado em Roma, era o lugar ideal para aquela família, cuja ambição era apenas viver tranquila e levar a diante a arte que perpetuara por várias gerações. Mas Argus Capellaro foi mostrando tamanha artimanha e habilidade quando se tratava de arte, que ao atingir sua adolescência foi estudar em Florença na Academia de Belas Artes. E o tempo escorrera rapidamente por suas mãos, tal como as maravilhosas esculturas e pinturas que aquelas mesmas mãos produziram, durante todo esse tempo que esteve longe de casa.
Ainda jovem conseguira realizar feitos que se igualavam aos de Michelangelo, que foi um pintor, escultor, poeta e arquiteto italiano, considerado um dos maiores criadores da história da arte do ocidente. E esse reconhecimento enchia seu ego de tal forma, que ele sonhava estar preso somente a este período de sua vida, não queria que a idade chegasse nunca, pois achava que com ela viria o esquecimento, o fim de toda essa paixão pela arte que sempre fora o motor de sua vida, e que perderia também toda sua beleza. Argus era dono de uma beleza que o fizera apaixonar por si mesmo, fazendo-o desejar congelar no tempo para poder contar com toda sua jovialidade, beleza e talento. E esse ardente desejo fervilhava no seu pensamento dia após dia, fazendo-o esculpir sua própria imagem com tamanha exatidão e perfeição. Argus se tornará tão obcecado com isso que não mais comemorava seus aniversários, pois isto apenas alimentava a sua angústia. Ele desejava cada vez mais, e sempre com mais fervor estagnar no tempo.
Em uma de suas exposições Argus Vittorio Capellaro conheceu alguém tão belo quanto ele, porém misterioso e ao mesmo tempo extraordinário, que dizia conhecer todos os seus desejos e trabalhos, todo aquele mistério tinha um nome, e era Pietra Lamounier. Ele não sabia como definir aquela experiência, se era algo mágico, sublime ou talvez apenas corriqueiro, a única certeza que tinha naquele exato memento é que seus olhos jamais haviam visto algo igual àquela linda imagem. A luz baixa do salão refletia de forma suave sobre as ondas daquele cabelo louro, e aqueles olhos que pareciam ter vida própria era um convite pra mergulhar naquele ser. Perturbado com aquela presença Argus resolveu se aproximar e percebera a quão crítica e devota de arte era aquela mulher, conversaram muito tempo e era algo tão agradável que nem percebera a hora passar. Aquela noite sem dúvidas era o início de um novo momento em sua vida.
Argus e Pietra estabeleceram uma linda relação de afeto um pelo outro, ao longo dos anos. Ele sempre alimentou a certeza de que ela era algo superior, um ser de beleza intocável, coisa que ele sempre desejará ser, percebia que o seu rosto continuava milimetricamente igual ao de anos atrás, e ela reparava como aqueles olhos verdes e curiosos a observava cada vez mais, numa mistura de questionamentos e fascínio. Não querendo confirmar a certeza de Argus ela decide se afastar do fenômeno da arte.
Aproximava se o vigésimo quinto aniversário de Argus, e com ele a intensificação do seu maior medo. Na semana que antecedia o seu aniversário ele se tornou uma pessoa introspectiva, depressiva e solitária pela ausência de sua melhor companhia, Pietra. Então alimentava em sua mente a certeza que queria ser lembrado apenas por sua beleza e talento, que não queria atingir a velhice para se tornar um crítico de arte, devido à bagagem de experiência que o acompanhará.
Na noite de 13 de março de 1811 o tão inesperado dia, Argus resolve presentear o seu ego, aquele doce desejo de ser imortalizado jovem para sempre. A cena era estranha, pois não tinha o aspecto de comemoração, apenas pairava no ar a sensação de despedida e lá estava ele na sala de sua casa, na companhia apenas de uma cadeira e uma corda. Decidiu então que esse seria o momento ideal para presentear a sua vontade, apoiado em uma cadeira amarrou a corda num lustre de cristal, passou-a em volta de seu pescoço e num golpe certeiro mandou a cadeira para longe, ficando ali suspenso apenas por aquela corda. Mas mal sabia ele que a vida o presentearia de outra forma. Aquele momento foi o mais demorado de sua vida, ele sentia uma forte compressão na traqueia fazendo-o sentir a falta do oxigênio, tinha a sensação que o seu cérebro inchava pela falta de sangue fornecido pelas artérias do pescoço, o seu corpo já amolecia e naquele momento tinha a certeza de sua morte. Quando de repente alguém adentra a sala, e ele vê apenas um vulto e ouve de longe chamar o seu nome, queria ele que fosse a morte lhe buscando. Pietra surpresa com a cena usou de toda sua destreza e agilidade para liberta-lo daquela corda, mas sabia que ele não resistiria, sendo assim resolveu tomar a atitude de maior piedade naquele momento, fez com que todas as vontades de Argus se realizassem e deu a ele o maior presente de todos, transformando-o em um vampiro.
Argus abria os olhos vagarosamente, não enxergava com nitidez, sentia apenas em sua boca o gosto da vida. Quando conseguiu abri-los totalmente viu o rosto de Pietra com os lábios tingidos de vermelho vivo, era o seu sangue. Então continuou ali estático e envolto pelos braços do mais belo dos anjos. Sua cabeça era um turbilhão de emoções e dúvidas, pois não estava entendendo o que acontecia naquele ambiente, sentia-se estranho, o corpo doía e coçava era como se tivesse recebendo sangue novo nas veias, sentia também os seus tecidos regenerando. A dor só aumentava cada vez mais, fazendo-o contorcer nos braços de Pietra. Ambos continuaram sentados ali no chão, ela esperando Argus recobrar os seus sentidos e ele apenas por encontrar algo que fizera esquecer-se da dor por alguns instantes. Depois daquele massacrante silêncio que invadia o local, Pietra com a voz trêmula resolveu dirigir a palavra a Argus e dessa forma disse a ele o que acabara de acontecer naquela noite. Com o choque da notícia e uma mistura de gratidão e satisfação, Argus não conseguia encontrar uma forma melhor de agradecer, além de beijá-la demoradamente, passaram ali uma fascinante noite de amor. A lua era testemunha de toda aquela entrega, e o fogo baixo da lareira era chama de todo aquele êxtase. Os gemidos de Pietra soavam como sinos aos ouvidos dele, as suas unhas frenéticas o arranhado eram parecidas com o toque suave da seda deslizando em sua pele. Dois corpos, sós, interagiam numa ligação ancestral. O vento que por hora se fazia presente era como música, e em seus embalos eles dançavam num ritmo lento e suave sem fim. Era a sua noite perpetua. A partir daquele dia a relação dos dois ficou mais intensa, Pietra era o norte de todo o trabalho de Argus e mais do que isso era a companhia ideal para belas noites de prazer, ela o ensinava a comportar como vampiro, mostrava a ele tudo que era necessário saber e o alertava sempre do perigo do desconhecido. Com o passar do tempo, percebeu nele a necessidade de ir adiante com seus trabalhos e projetos, pois já haviam se passado 100 anos de companheirismo. E foi nesse exato momento que ambos tomaram rumos diferentes, mas sempre se encontrava mundo a fora. Ele com seu belíssimo trabalho e ela com sua sincera admiração pela arte, e em especial por Argus Vittorio Capellaro. Estabeleceram assim uma relação saudável e amistosa ao longo de toda sua não vida.
Argus rodou o mundo inteiro com o seu trabalho, passou por vários países e esteve presente nos maiores museus do mundo, começando na Galeria Uffizi na Florença, Museus do Vaticano, Museu de Roma, na Venezuela no Museu de Arte Contemporâneo de Caracas Sofia Imbe, e mundo a fora: Museu Nacional Suíço, no Pushkin Museu de Belas Artes na Rússia, no Museu Nacional de Arte de Auckland na Nova Zelândia, Museu da Macedônia, Museu Nacional de Kioto, Galeria Nacional da Irlanda, London Museum na Inglaterra, na Índia no Museu Príncipe de Gales, Museu da Acrópole na Grécia, Museu do Louvre na França, Instituto de Arte de Chicago, Museu Del Padro em Madri, Museu Dinamarquês de Arte Decorativa, Galeria Nacional do Canadá, Albany Museum na África do Sul, em Portugal no Museu Nacional de Arte Antiga e nesse ano de 2011 sua mais recente exposição se realizará no Brasil no Palácio das Artes em Belo Horizonte, um dos eventos mais aguardados, com um belíssimo acervo.
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